A “Constelação” de obras que expõe o brilho da arte africana no Algarve
por Afrolink
A instalação de Tristany Mundu hasteia bandeiras que desafiam a romantização da história portuguesa, gravada, entre outros símbolos, na ideia de “heróis do mar”, contida no hino nacional. O trabalho, intitulado “Hinu Digra” e revelado na exposição “Interferências”, no lisboeta MAAT, é cunhado do seu aclamado álbum de estreia “Meia Riba Kalxa”.
A realidade lusa também marca presença nas criações de Rafaela A Neto, co-fundadora do colectivo Fonte, que constrói obra por artes de design gráfico, fotografia e vídeo, transportando tanto de individual como de comunitário, num diálogo entre origens angolanas e vivências africanas diaspóricas.
Ambos presentes na exposição colectiva “Constelação”, Tristany e Rafaela partilham pertenças africanas se encontram em Angola, embora não se esgotem numa única geografia.
Os seus trabalhos juntam-se aos de Jessica Sarkodie, fotógrafa e escritora ganesa, especializada em capturar narrativas de viagem; Tobi Onabolu, artista nómada com base no Benim; Sophie Kabaka, escritora e artista visual que vive entre Kigali, no Ruanda, e Lisboa; e Theo Gould, fotógrafo britânico-queniano radicado em Lisboa.
Com Jessica temos a série “This is Home” (“Isto é casa”), que visibiliza a ocupação de construções inacabadas que se tornou paisagem comum num dos bairros mais povoados de Acra, no Gana. Por sua vez, Tobi explora um caminho espiritual onde o mindfulness e a quietude emergem como aspectos centrais, permitindo a conexão e reconexão com o corpo.
Já Sophie Kabaka usa o desenho como forma de expressão, demonstrando como um retrato pode celebrar e preservar a vida, desafiar a morte, e representar beleza na dor. Finalmente, Theo Gould explora a identidade racial e cultural, apontando o foco para pessoas com múltiplas heranças, e capturando a essência do que essas influências significam. A que mundo se pertence quando temos várias pertenças?
Cada um com a sua proposta, disciplina artística e assinatura criativa, todos partilham ‘casa’ na Galeria Sala Simba, fundada pela queniana-britânica Frances Nyawira Gould na cidade algarvia de Olhão.
“Esta coabitação desafia narrativas pré-definidas e práticas partilhadas”, lê-se no texto de divulgação da mostra, onde se destaca o “processo de interacção e troca” entre as obras, transcendendo limites geográficos e culturais.
“A exposição assume a aparência de um laboratório de conexão, no qual trabalhos artísticos divergentes se fundem num intrincado tecido conceptual”, prossegue a mensagem, que sublinha a força desse entrosamento.

Instalação “Hinu Digra”, de Tristany, previamente exibida no MAAT, Lisboa, ne exposição “Interferências”

A arte de Rafaela A Neto, que nos conduz por raízes angolanas e realidades africanas diaspóricas
Por esses cruzamentos, os visitantes são desafiados a ir além da dimensão estética, num convite a um exame minucioso para identificarem as interacções inesperadas que se estabelecem entre as criações.
“Neste sentido, o acto de contemplação é transformado em envolvimento activo” e, “tal como acontece com as constelações celestiais, os trabalhos encontram harmonia no facto de pertencerem a um todo maior”.
Patente até 30 de Setembro, “Constelação” tem a curadoria de Jermay Michael Gabriell, apoiada pela consultoria de Ekua Yankah.