A resistência de Angella Graça, na luta pelo direito a ser…humana

Neta, filha e irmã de imigrantes e emigrantes, Angella Graça nasceu em Paris em 1989, mas, antes ainda se iniciar no ensino primário, veio para Portugal, onde se formou em Relações Internacionais, e trabalha como técnica superior de Recursos Humanos. O meio em que cresceu, dominado por histórias de resistência e sacrifício – incluindo a sua própria batalha com o SEF –, acentuou-lhe a personalidade activista, entretanto amadurecida no INMUNE – Instituto da Mulher Negra em Portugal, associação feminista interseccional à qual preside. Amanhã é dia de a ouvirmos, na emissão semanal d’O Lado Negro da Força. Agora às 21h.

por Afrolink

Baixar os braços nunca foi opção. Seja pela personalidade, naturalmente interventiva, seja pela realidade, estruturalmente condicionada, Angella Graça sentiu cedo um dever de resistência. “Alguma coisa direccionou-me [para o activismo], e me fez reagir ao contexto”, conta a presidenta do INMUNE – Instituto da Mulher Negra em Portugal, em entrevista ao podcast “Anita no trabalho”.

Na mesma ocasião, Angella salientou ainda o peso das vivências, que “obrigam” as pessoas racializadas “a ter este ímpeto de posicionamento, de luta”.

Neta, filha e irmã de imigrantes e emigrantes, numa história com raízes em Cabo Verde e ramificações em Portugal e em França, Angella, que também é mãe, percebeu, logo nos primeiros anos de vida, que o direito a ser implicava estar preparada para combater.

“O sistema impõe-nos uma diferenciação, faz com que vivamos experiências mais desconfortáveis mais cedo”, reforçou nesse podcast, elencando alguns dos desafios que acompanharam a sua formação.

Um caminho de todas e de todos

Para começar, a velha e persistente batalha por documentos. Nascida há 31 anos em Paris, e a partir dos quatro ou cinco anos em Portugal, Angella viveu em situação irregular até aos 18 anos.

A experiência, demasiado comum na experiência de africanos e afrodescendentes, atrasou um ano a sua entrada no Ensino Superior, de onde saiu com a licenciatura em Relações Internacionais.

Mas, antes disso, ainda teve de enfrentar uma “relação conturbada” com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), para aquisição da autorização de residência.

“Tudo isto, cumulativamente ao longo de uma vida, vai deixando as suas marcas, as suas cicatrizes”.

O rasto de dor, acentuado também pelas histórias de esforço e sacrifício das pessoas mais próximas, reforça o compromisso com a intervenção social e comunitária, e a consciência de que a mudança exige uma mobilização colectiva.

“Portugal ainda precisa de se olhar realmente e de se conhecer. De conhecer e reconhecer a sua história. Quando tal acontecer, haverá espaço para um diálogo transparente e para mudanças efectivas. É um caminho que está a ser feito, muito lentamente”, nota a técnica superior de Recursos Humanos, em entrevista à Agir, revista da Amnistia Internacional Portugal.

À mesma publicação, Angella Graça projecta os planos para o INMUNE, indissociáveis das suas inquitações humanas, nomeadamente feministas, raciais, e familiares.  “O nosso objectivo é que o instituto seja usado em benefício das mulheres negras em Portugal. E isso significa beneficiar as famílias, os filhos, as filhas, significa envolver os homens. É um caminho de todas e de todos!”. Juntos!

A apresentação prossegue amanhã, na emissão semanal d’ O Lado Negro da Força, via Facebook e no YouTube. Agora com início às 21h.