Do Rosa-choque à saída-surpresa, há vida para o Plano Nacional contra o racismo?

Ainda a tentar recuperar do choque da saída de Rosa Monteiro do cargo de Secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade – cujo mandato fica ligado, entre outros marcos, à aprovação do Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação –, somos surpreendidos com o pedido de demissão da sua sucessora, Sara Guerreiro, “por razão pessoal de força maior”. A nova mudança, pouco mais de um mês após a nomeação – e numa altura em que o acolhimento a refugiados ucranianos está envolto em polémica –, coloca agora Isabel Rodrigues no papel de Secretária de Estado da Igualdade e Migrações. De que forma estas movimentações influenciam a luta anti-racista, nomeadamente a implementação do Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação? Reflectimos mais logo n’ O Lado Negro da Força.

por Afrolink

No Verão de 2020, Rosa Monteiro, na qualidade de Secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade, marcava presença na sede do SOS Racismo onde, a seu pedido, reuniu com três elementos do movimento. “Acabámos por rir do facto de ser a primeira vez em 30 anos que um membro do Governo o fez”, partilhava a então governante, nas redes sociais.

“Conversámos acerca das suas preocupações com a escalada de incitamento ao ódio racista contra os seus líderes, deputadas e outros activistas anti-racismo, mas também falámos do futuro das políticas públicas nesta área e da evolução/estruturação que estas políticas devem ter, em articulação com as associações”, destacava ainda Rosa Monteiro, assinalando que, “ao contrário dos ventos de violência e de extremismo que correm, o encontro foi de união, tranquilidade e resiliência”.

Meses mais tarde, a responsável repudiava, também nas redes sociais, a petição lançada para a deportação do activista Mamadou Ba.

“Continuamos com todo o empenho no combate à discriminação, como responsabilidade colectiva, para uma política afirmativamente anti-racista”.

Os esforços inclusivos, igualmente evidenciados na luta contra a ciganofobia e na defesa da igualdade de género, tiveram como último grande marco a apresentação pública do Plano Nacional contra o Racismo e a Discriminação. Mais do que um documento indissociável do seu mandato, terá sido também o responsável pela sua não recondução? Será o afastamento o preço a pagar por se colocar, na narrativa oficial do Executivo o reconhecimento da existência de racismo estrutural?

A própria mudança de nomenclatura introduzida pela tutela – de Secretaria de Estado para a Cidadania e Igualdade para Secretaria de Estado da Igualdade e Migrações – sugere um novo retrocesso na luta, colando-se racismo a migrações, como alguém que não consegue ver portugueses negros.

Mais: retirar essa frente da governação da alçada da Ministra da Presidência, passando-a para os Assuntos Parlamentares é indicador da intenção de romper com os avanços que vinham sendo obtidos.

Ainda assim, o currículo da sucessora de Rosa Monteiro no domínio dos Direitos Humanos – aliado ao facto de ser mãe de uma criança bi-racial – introduzia alguma esperança de não vermos o Plano Nacional contra o Racismo e a Discriminação acabar na gaveta.

Agora que a saída de Sara Guerreiro está consumada, pouco mais de um mês após ter chegado ao Governo, o que esperar da entrada de Isabel Rodrigues?

Deputada do PS eleita pelo círculo eleitoral dos Açores, a nova Secretária de Estado estava na Assembleia da República desde 2019, apresentando um currículo despido de referências naquela que é a maior luta nossa de cada dia: contra o racismo e a xenofobia. Mais um mau presságio?

A reflexão prossegue mais logo n’ O Lado Negro da Força.

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