O livro das “Histórias e Memórias de Mulheres de Cabo Verde em Portugal”

Neste 27 de Março, em que se assinala o Dia da Mulher Cabo-Verdiana, regressamos às páginas do livro “Histórias e Memórias de Mulheres de Cabo Verde em Portugal”, produzido no âmbito do projecto Memória e Feminismos da UMAR – União de Mulheres Alternativa e Resposta.

por Paula Cardoso

foto de capa*

O combate ao fascismo entrelaçado à luta pela igualdade do género, num Cabo Verde pré-25 de Abril, reaviva-se pelos testemunhos de Georgina Benrós de Mello e Alice Matos, apresentadas como “Duas Mulheres Pioneiras na construção da OMCV” – Organização das Mulheres de Cabo Verde.

Com as memórias anteriores à libertação, recuperam-se também as vivências das cabo-verdianas Fernanda Costa, Lourença Semedo, Ana Josefa Cardoso, Assunção Fernandes, Zeuga Semedo e Maria do Carmo Lopes, que, nos anos de 1970 e 1980, chegaram a Portugal. Muitas por reagrupamento familiar, mas tantas outras também na fuga aos apertos de uma economia fustigada por secas severas.

Desses movimentos, nasceram as primeiras gerações de afrodescendentes, onde se incluem Vilma Vieira, Carla Fonseca e Denise Santo.

Sempre na primeira pessoa, essas 11 mulheres dão vida ao livro “Histórias e Memórias de Mulheres de Cabo Verde em Portugal”, produzido no âmbito do projecto Memória e Feminismos da UMAR – União de Mulheres Alternativa e Resposta, com coordenação de Teresa Sales.

A emancipação pela educação

A obra, financiada pela Pequena Subvenção da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, foi apresentada no ano passado, e pode ser lida online.

Mais do que trazer para o centro da narrativa histórias habitualmente periféricas, o trabalho, considera Teresa Sales, permite um olhar sobre processos de mobilidade social.

“O livro começa com uma frase que para mim diz muito em relação a isso”, assinala, a coordenadora do projecto Memória e Feminismos da UMAR, destacando uma afirmação da da economista Georgina Benrós de Mello. Segundo a ex-ministra do Comércio e Turismo de Cabo Verde, que de 2014 a 2020 assumiu a direcção geral da CPLP, “a História de Cabo Verde prova que o mecanismo mais rápido de ascensão social é a educação”.

As palavras ganham expressão concreta nos relatos recolhidos por Teresa Sales.

“Nota-se que já todas têm cursos, que existe essa emancipação pelos estudos”, nota a autora, adiantando que, a cada entrevista, teve a preocupação de ligar gerações, colocando as filhas a falar das mães, por exemplo.

“Não queremos perder a memória destas mulheres, que é algo muito importante”, sublinha Teresa Sales, adiantando que, apesar de o livro apresentar perspectivas diferentes – à medida de gerações diferentes – evidencia um património comum de experiências de discriminação racial.  “O problema grave do racismo é sentido por todas”, assinala.

A par dos 11 testemunhos presentes “Histórias e Memórias de Mulheres de Cabo Verde em Portugal”, o livro inclui uma homenagem a Helena Lopes da Silva, assinada por Manuela Tavares, da Direcção da UMAR.

O texto-memorial destaca o contributo da falecida médica-cirurgiã e fundadora do Bloco de Esquerda para o combate ao fascismo, racismo e machsimo.

“Na luta pela libertação das antigas colónias portuguesas centrou a sua militância anti-fascista, na universidade, quando veio para Portugal. Foi membro do PAIGC, da Casa dos Estudantes das Colónias da qual chegou a ser presidente. Gritou muitas vezes: “Nem mais um soldado para as Colónias” em manifestações e acções, logo a seguir ao 25 de Abril de 1974. Para além das causas feministas, fez da luta anti-racista, uma das suas bandeiras”. 

*fachada do Centro Cultural Cabo Verde, em Lisboa

Capa e contra-capa do livro “Histórias e Memórias de Mulheres de Cabo Verde em Portugal”, produzido no âmbito do projecto Memória e Feminismos da UMAR – União de Mulheres Alternativa e Resposta.

Georgina Benrós de Mello e Alice Matos são apresentadas, na obra, como “Duas Mulheres Pioneiras na construção da OMCV” – Organização das Mulheres de Cabo Verde