Ocupação ilegal, despejo legítimo? Que política temos para a habitação?

O despejo, nos últimos dias, de várias famílias no bairro do Griné, em Aveiro, evidencia uma vez mais a incapacidade de o Estado dar resposta aos problemas de Habitação. Enquanto os moradores garantem que andam há anos a tentar regularizar uma situação que reconhecem ser ilegal, sem que o Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) se digne sequer a recebê-los, a entidade pública parece encerrar todo e qualquer sinal de contestação na legitimidade da acção. Porque, sustenta o IHRU, o que está em causa é a “desocupação de habitações que foram ocupadas ilegalmente”. Sobre as pessoas desalojadas, numa lista que inclui crianças, uma mulher grávida e um homem com uma deficiência motora, nem uma palavra. Essa ficou para o ministro das Infra-Estruturas e Habitação, Pedro Nuno Santos, que, no início da semana, no Parlamento, reforçou a desumanidade das políticas de acesso à habitação. Como se o problema estivesse nas pessoas, e não no sistema que as exclui e marginaliza. Comentamos n’ O Lado Negro da Força.

 

por Afrolink

A lei é a resposta. Aliás, a única resposta. De um lado, o IHRU refere que as ocupações ilegais de casas no bairro do Griné, em Aveiro, impedem “a realização das intervenções de reabilitação das habitações ocupadas e, como tal, a respectiva atribuição a famílias que aguardam, em listas de espera e no cumprimento da lei, o acesso a uma habitação pública”.

Do outro lado, o ministro das Infra-Estruturas e Habitação, Pedro Nuno Santos, reforça o tom do ‘castigo’ aplicado aos ‘cidadãos malcomportados’. “As desocupações vão ser levadas por nós com muito afinco até ao fim, seja em Aveiro ou em qualquer outro sítio”, avisou no início da semana o governante, insistindo na ideia de que lei tem de ser cumprida por todos.

“No dia em que começarmos a pactuar com as ocupações ilegais não vamos mais ter confiança por parte das nossas famílias, dos trabalhadores, das famílias que estão em lista de espera, confiança na política pública de habitação, confiança no Estado”, disse Pedro Nuno Santos no Parlamento, dirigindo-se aos deputados das comissões de Orçamento e Finanças e de Economia, Obras Públicas, Planeamento e Habitação.

De fora da intervenção do ministro ficou uma apreciação à responsabilidade das entidades públicas neste e noutros processos de despejo.

Afinal, se os moradores são os primeiros a reconhecer a situação de ilegalidade em que vivem, e garantem que andam há anos a tentar resolvê-la, como explicar este desfecho-limite?

Quando os moradores admitem que agiram ao arrepio da lei por falta de alternativas de habitação, e se disponibilizam para encontrar uma solução, como justificar que a única resposta seja o despejo?

Mais: segundo a comissão concelhia de Aveiro do PCP, tanto o IHRU como a Câmara Municipal de Aveiro vêm acumulando casas desabitadas e encerradas a tijolo, enquanto os moradores “sempre estiveram disponíveis para regularizar as suas situações naquelas casas” e “estão em listas de espera para uma habitação há anos, alguns deles há mais de 15 anos”.

“É amplamente conhecido o problema do acesso à habitação no concelho de Aveiro. É o reflexo de décadas de políticas que favorecem a especulação imobiliária, que potenciam o aumento contínuo e desmesurado no valor das rendas, ao mesmo tempo que se adia a resposta pública necessária que garanta o direito Constitucional à habitação, um direito universal, o direito a um nível de vida adequado, assegurando uma habitação adequada a todos, económica e fisicamente acessível”.

O retrato, ampliado à escala nacional, continua a retirar o tecto a muitas famílias. Porque, aparentemente, a única lei que importa cumprir é a dos despejos. Enquanto isso, o direito à habitação constitucionalmente continua a ser atropelado.

Nos últimos dias foi em Aveiro, com o desalojamento de dezenas de pessoas, numa lista que inclui crianças, uma mulher grávida e um homem com uma deficiência motora. O que nos reservam os próximos dias?

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