Sete mornas para apoiar os músicos da Ilha da Boa Vista a resistir à Covid-19

Sem trabalho há meses, por causa da pandemia, os músicos da Boa Vista, em Cabo Verde, apresentam o seu hino de resistência: uma série de sete mornas tradicionais. As composições, para conhecer a partir de hoje, dão o mote a uma campanha de angariação de fundos em prol dos artistas, dinamizada por Bárbara Wahnon. Para apoiar até 31 de Agosto.

por Paula Cardoso

O que é que a Ilha da Boa Vista tem? Músicos e mornas como ninguém! Pelo menos, enquanto durar a recém-divulgada campanha “Sete dias, sete mornas”.

Lançada por Bárbara Wahnon – portuguesa que, em Março, rumou a Cabo Verde e acabou confinada pela Covid-19 –, a iniciativa procura dar resposta ao impacto negativo da pandemia na vida dos músicos locais.

“Decidi angariar fundos a cantar sete mornas tradicionais, das mais bonitas que aprendi aqui na Ilha, durante a quarentena”, introduz a também artista, integrante do Gospel Collective.

Acompanhada de seis músicos, nomeadamente Tibo Évora (Voz), Manuel Brito (Violão), Severo Estrela Lima (Violão), Cipy Rodrigues (Cavaquinho), Ivandro Almeida (Percussão) e Márcio Morais Estrela (Saxofone), Bárbara soltou a voz em sete lugares da Boa Vista, também como forma de divulgar as belezas extra-sonoras da ilha.

“Tentámos arranjar um cenário que complementasse o significado de cada música”, diz a cantora ao Afrolink, adiantando que a importância dos espaços será explicada à medida que os vídeos forem partilhados.

Mornas apresentadas uma vez por semana

A primeira canção é apresentada hoje, a partir das 19h locais, 21h em Portugal, horário que se manterá até ao final da campanha, a 31 de Agosto.

Sempre à segunda-feira, através das contas de Bárbara no Facebook, Instagram e YouTube, as músicas afinam a pauta comum: apoiar os artistas na resistência à Covid-19, através de donativos.

Os contributos poderão ser efectuados via transferência bancária – em Cabo Verde, para a Associação dos Músicos da Boavista, e, em Portugal, para a conta da Bárbara –, segundo indicações que vão acompanhar cada morna.

“Vou partilhar o meu NIB pessoal porque os custos com transferências internacionais são gigantes. Desta forma, no final da campanha, faço uma transferência única da minha conta”, esclarece a cantora, apelando à solidariedade de todos.

No coração da própria história

“Gostava mesmo que se focassem no conteúdo da mensagem”, sublinha, consciente de algumas desafinações de percurso.

“As filmagens foram feitas em tempo recorde, e não houve margem para acertar detalhes. Cada morna foi filmada em dois takes, um com imagens fixas, e outro gravado do início ao fim, sem pausas, com um plano dinâmico”.

Apesar das limitações – “Foi tudo feito à base de voluntariado” –, Bárbara nota que a equipa procurou sempre obter “a melhor qualidade possível com o mínimo de recursos possível”.

“O quer vão ver não são videoclipes. São vídeos de nós a cantar em sítios escolhidos a dedo, para ilustrar o conteúdo da morna”.

As gravações foram concentradas em cerca de cinco horas, num único dia, excepção feita para o tema Maria Barba. Nada mais, nada menos, do que o nome da bisavó de Bárbara e da canção que a mesma imortalizou.

Com o apoio da Câmara Municipal da Boa Vista, a música foi gravada na Povoação Velha, perto da casa onde Maria Barba nasceu. No coração da história que inspirou Bárbara a partir em busca da sua voz cabo-verdiana, aqui entoada de forma colectiva.

“Não estou a preparar esta iniciativa sozinha. Este projecto não é sobre mim. É sobre a procura de uma identidade que se reflecte na música e que se encontra na Cultura”, realça a bisneta de Maria Barba, defendendo que a identidade de um povo sem música não existe.

“Porque a música vem do sentir, e a identidade é algo que não se explica: sente-se”. Agora por sete dias, sentidos em sete mornas.