O que há de negro em nós? - a reflexão que aproxima mundos a partir da escola
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O que há de negro em nós? - a reflexão que aproxima mundos a partir da escola
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Durante três anos, de 2012 a 2014, o professor de História Danilo Cardoso fez da ausência negra nos manuais escolares uma nova presença em salas de aulas do Brasil. A intervenção, à medida de necessidades igualmente identificadas no ensino português, concretizou-se através do projecto “O que há de negro em nós?”. Mais do que um convite à reflexão, uma via aberta para a transformação do ambiente escolar.
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por Paula Cardoso
Sem páginas de História que documentem conquistas, invenções, criações ou simplesmente perspectivas negras, Danilo Cardoso tratou de converter esse apagamento em reconhecimento.
Com o projecto de arte-educação “O que há de negro em nós?”, que desenvolveu e implementou entre 2012 e 2014 no Brasil, o professor desafiou os alunos a verem o que é invisibilizado e a ouvirem o que é silenciado.
Tudo a partir de focos de interacção: “Quem são as pessoas negras que convivem com vocês?”.
A pergunta, dirigida a turmas maioritariamente brancas e de classe média alta, começou por ecoar num vazio. “Que difícil! Eu não convivo”.
A ausência de referências negras, evidenciada nas reacções dos alunos, foi desconstruída pelo professor de História com um convite à observação. “Presta atenção! Acorda, anda pelo prédio, vai para a escola, entra na sala, vai para o shopping. Quem são essas pessoas que estão passando por vocês?”.
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Colocar no centro o que está à margem
A “provocação”, conforme Danilo apresenta, funcionou como um poderoso abre olhos. “Começaram a perceber os corpos negros de que antes não se davam conta”.
Mais do que facilitar o reconhecimento de um mundo não branco, o exercício proposto permitiu colocar no centro vidas habitualmente atiradas para as margens.
“O objectivo também era fazer entrevistas com essas pessoas, para saber quem elas são, e de onde elas são”, explica o mestre em Educação, abrindo aqui um parêntesis de contextualização cultural.
Apesar de compreender que, no universo luso, esse questionamento é indissociável de narrativas de desnacionalização do negro, o mestre em Educação nota que a sua identidade se contruiu sob outros códigos étnico-raciais.
“Para mim, perguntar de onde a pessoa é não equivale a dizer que ela não é do lugar onde está. É apenas uma forma de saber como ela foi parar a esse lugar”.
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Desproblematizar realidades
No Brasil, esse processo de conhecimento proposto pelo “O que há de negro em nós?” favoreceu a aproximação e humanização de realidades que antes cabiam apenas naquele plano do “Que difícil!”.
“A partir do momento em que perceberam outros corpos, os alunos começaram a entender a origem de algumas diferenças, até mesmo na disciplina corporal. Porque é que um aluno habituado a brincar num prédio provavelmente tem menos dificuldade de ficar quieto, todo organizado, enquanto aquele que vem de um ambiente mais de rua, tende a ser mais agitado”.
Danilo sublinha que a consciência das especificidades de cada grupo, facilitada ainda por discussões, exposições de artes plásticas, reflexões, palestras e visitas ao Museu AfroBrasil, teve um impacto positivo nas relações humanas, encurtando distâncias que no início pareciam intransponíveis.
“Como o projecto vinha um ano antes de começarmos a falar na Revolução Industrial e toda a questão da luta de classes, quando este assunto entrava, os alunos já olhavam para os mais vulneráveis de outra forma: como seres humanos”.
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À medida das necessidades do ensino português
O efeito parece encaixar na perfeição no que se pretende com a proposta para repensar o ensino da História em Portugal, sobretudo a história das antigas colónias.
Por recomendação do Conselho da Europa, publicada em relatório no ano passado,“as autoridades portuguesas devem reforçar a educação para os direitos humanos e igualdade”, sem omitir “a discriminação e a violência cometidas contra os povos indígenas nas ex-colónias”.
A instituição europeia assinala ainda, no mesmo documento, que “a narrativa da descoberta do Novo Mundo deve ser questionada”, incluindo, na matéria leccionada aos alunos, a história dos afrodescendentes. Ao encontro do que há de negro em nós.
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