Georgina Ribas: musicóloga, feminista,
e força da intelectualidade africana

“Um povo sem o conhecimento da sua história, origem e cultura é como uma árvore sem raízes”, escreveu o jamaicano Marcus Garvey, um dos ícones maiores do movimento pan-africano. Retomamos aqui o seu pensamento para enquadrar as linhas que se seguem. Com actualização semanal, darão a conhecer, de forma sucinta, figuras e episódios que fazem parte do legado negro. Georgina Ribas, pianista, professora de música, feminista e pan-africanista é a protagonista que se segue.

por Paula Cardoso

O pouco que sabemos sobre Georgina Ribas é o suficiente para percebermos que deveríamos saber muito mais. Mas, tal como acontece com a generalidade das personalidades negras que marcaram a sociedade portuguesa, os seus méritos surgem dispersos, muitas vezes como notas de rodapé em listas de créditos alheios.

É assim que encontramos o seu nome associado à obra do violinista, maestro, arranjador e compositor Lopes da Costa, e à história de Luís de Oliveira Guimarães, fundador e primeiro presidente da Sociedade Portuguesa de Autores.

A ligação de Georgina a Lopes da Costa surge em “Vista Alegre”, obra produzida para o teatro de revista (Teatro do Ginásio, em 1934) que ajudou a compor.

Já com Luís de Oliveira Guimarães, a parceria da angolana encontra-se nos créditos musicais da peça “Corridinho”.

 

Não fossem as referências ‘escavadas’ por intelectuais africanos, como Mário Pinto de Andrade, e estudiosos da presença africana em Portugal, como Cristina Roldão, José Pereira e Pedro Varela – co-organizadores da exposição “Para uma história do movimento negro em Portugal, 1911-1933”, apresentada no ano passado – e, provavelmente, não teríamos nada mais a acrescentar. Felizmente, temos.

 “Grande influência social e moral junto da intelectualidade africana”

Num artigo publicado em 2014 no Jornal de Angola, Filipe Zau, doutorado em Ciências da Educação e mestre em Relações Interculturais, lembrou o papel da sua conterrânea nos primórdios do associativismo de Angola.

Recuando à génese do Grémio Africano, Filipe Zau recorda que a estrutura – cujos estatutos foram aprovados “pelo Governo Civil de Lisboa, a 28 de Agosto de 1929” – “tinha como principais objectivos ‘concorrer para o prestígio social e mental dos africanos; congregar e estreitar os laços de uma união e solidariedade entre naturais d’África e as raças nacionais; promover o levantamento do nível intelectual e revigoramento físico dos indígenas da África Portuguesa”.

O especialista adianta que, segundo Mário Pinto de Andrade, “nesta associação [do Grémio Africano] distinguiu-se Dona Georgina Ribas, notável musicóloga feminista, que exerceu grande influência social e moral junto da intelectualidade africana então residente na capital portuguesa”.

Nascida em Angola, em 1882, a pianista chegou a Portugal com três anos, tendo-se formado no Conservatório Nacional de Lisboa. Foi também professora de música num espaço no Rossio.

Cristina Roldão, em texto assinado no “Público”, adianta igualmente, citando o periódico “A Voz D’Africa”, que, em 1929, Georgina estaria “envolvida na direcção da Liga das Mulheres Africanas, organização sobre a qual pouco mais sabemos do que ter feito parte do Partido Nacional Africano”. Hoje, quase 70 anos depois da morte de Georgina, queremos e merecemos saber mais.