Myriam Taylor apela à acção contra “as sombras persistentes do colonialismo”

Presente na terceira sessão do Fórum Permanente de Pessoas Afrodescendentes, que decorreu de 16 a 19 de Abril, na Suíça, Myriam Taylor, activista pelos Direitos Humanos, co-fundadora e dreamer in chief da Muxima, lembrou o quanto “é desanimador observar que muitos países”, incluindo Portugal, “não têm representantes de ascendência africana nas suas delegações”, ausência que, apontou, “sublinha a natureza pervasiva do racismo sistémico que abrange múltiplos sectores: academia, política, media, tecnologia, diplomacia e justiça”. Além de ter defendido a obrigatoriedade de todas as missões da ONU incluírem representantes afrodescendentes, “para promover uma verdadeira diversidade e equidade no palco global”, a empresária apelou à assinatura do Pacto da Humanidade, apresentado no final da Humanity Summit, iniciativa que promoveu em Portugal, em Setembro do ano passado. “Este pacto não é apenas um plano de acção; é um conjunto de 24 Objectivos Estratégicos com roteiros que resultam de engenharia reversa, projectados para desmantelar as sombras persistentes do colonialismo e confrontar o ressurgimento de forças divisórias”. Leia a intervenção de Myriam Taylor na íntegra.

Myriam Taylor é empresária de impacto social, public speaker e activista pelos Direitos Humanos. Tem como objectivo mudar o Mundo e transformá-lo num lugar onde as gerações futuras não tenham de enfrentar as mesmas dificuldades que teve como criança negra e mulher. Myriam nasceu em Albufeira e é filha de pais angolanos que se fixaram no Algarve em 1976 como refugiados da guerra civil em Angola.  

Myriam Taylor

Myriam Taylor esteve na terceira sessão do Fórum Permanente de Pessoas Afrodescendentes, que decorreu de 16 a 19 de Abril, em Genebra, capital da Suíça.

Intervenção de Myriam Taylor, na 3.ª sessão do Fórum Permanente de Pessoas Afrodescendentes, em Genebra, Suíça

Honrada Presidente, estimados delegados, respeitados colegas,

Mwazekele,

Hoje, apresento-me perante vós não apenas como eu mesma — Myriam Campos Xafredo Taylor de Carvalho — mas como representante de todos aqueles que me precederam, trazendo comigo os ecos das suas lutas e o peso dos seus sonhos. Presto homenagem a todos os nossos antepassados. Axé!

Como mulher portuguesa negra e europeia, valorizo profundamente o privilégio de estar aqui hoje. Estamos no Fórum Permanente de Pessoas Afrodescendentes, um espaço supostamente dedicado às nossas vozes. No entanto, é desanimador observar que muitos países, incluindo o meu — Portugal — não têm representantes de ascendência africana nas suas delegações. Esta ausência sublinha a natureza pervasiva do racismo sistémico que abrange múltiplos sectores: academia, política, media, tecnologia, diplomacia e justiça. Apesar das contribuições significativas que indivíduos afroportugueses têm feito, tanto para a nossa nação quanto globalmente, continuamos a enfrentar barreiras às oportunidades.

Por isso, proponho uma alteração vital: deveria ser obrigatório que todas as missões da ONU incluíssem representantes de ascendência africana. Esta mudança é crucial para promover uma verdadeira diversidade e equidade no palco global.

Este ano marca o 50.º aniversário do 25 de Abril de 1974, um momento crucial na história de Portugal. Há cinquenta anos, nenhum negro podia votar em Portugal. Hoje, cinco décadas depois de derrubarmos um regime fascista que silenciava as nossas vozes e restringia as nossas liberdades, um partido antidemocrático conquistou 50 lugares no nosso Parlamento. A extrema-direita está a ganhar terreno não só na Europa, mas em todo o mundo, apresentando riscos inegáveis a todas as comunidades racializadas e desfavorecidas e a toda a Humanidade.

E a questão que coloco é: Como podemos salvaguardar os nossos direitos conquistados? Como cumprimos a promessa da Democracia?

“Cada geração deve descobrir a sua missão, cumpri-la ou traí-la, em relativa opacidade.” Esta citação de Fanon sublinha a responsabilidade que cada geração tem em moldar e progredir a justiça social.

Imaginem… E se subvertermos o sistema e reivindicarmos a agenda social, económica e política para nós, o Povo?

É neste quadro de transformação que elaborámos o Pacto da Humanidade, um esforço colectivo nascido das diversas visões de 110 visionários de 45 países. Este pacto não é apenas um plano de acção; é um conjunto de 24 Objectivos Estratégicos com roteiros que resultam de engenharia reversa, projectados para desmantelar as sombras persistentes do colonialismo e confrontar o ressurgimento de forças divisórias.

A nossa missão transcende os quadros tradicionais; é um chamado claro para corrigir erros históricos e forjar um futuro onde a justiça e a igualdade iluminem os legados mais obscuros do nosso passado.

Este pacto desafia as bases coloniais que há muito influenciam as relações globais, esforçando-se para substituí-las por uma ordem mundial que valorize a diversidade, sustente a dignidade e garanta a equidade.

Ao implementarmos o Pacto da Humanidade, não estamos apenas a remodelar paradigmas antigos, mas também a celebrar marcos.

Empresas, ONGs e indivíduos estão a adoptar novos modelos de cooperação que priorizam o bem colectivo em detrimento do interesse próprio restrito. Vamos pressionar os nossos Governos também!

Esta iniciativa é crítica porque fornece uma abordagem estruturada para enfrentar desafios globais através de uma lente equitativa. Integrando princípios decoloniais nas nossas estratégias, garantimos que nenhuma comunidade seja deixada para trás.

Estamos a construir um legado que respeita as nossas histórias entrelaçadas enquanto pavimentamos o caminho para um futuro sustentável.

Insto cada um de vocês a comprometer-se com esta mudança transformadora. Vamos desmantelar as estruturas opressivas que persistem nas nossas instituições e rejeitar as ideologias que procuram dividir-nos.

Insto cada um de vocês a assinar primeiro o Pacto da Humanidade. Ao fazer isso, comprometem-se a fazer parte de um movimento global dedicado a remodelar as nossas sociedades de formas que promovam a justiça, aumentem a equidade e celebrem a diversidade. Este pacto não é apenas um documento — é um compromisso de acção, um compromisso de defender a dignidade de cada ser humano e um compromisso com um futuro sustentável para todos.

Ao estarmos neste momento crucial da História, escolhamos o caminho da unidade e da força colectiva. Os desafios que enfrentamos são formidáveis, mas juntos, temos o poder de superá-los. Abracem os princípios do Pacto da Humanidade e trabalhem incansavelmente por um mundo onde a justiça prevaleça, a igualdade seja a norma, e cada indivíduo tenha a oportunidade de prosperar.

Não devemos demorar, pois à medida que a extrema-direita ganha terreno globalmente, a nossa missão torna-se ainda mais crítica. Conhecemos os riscos que ameaçam todas as comunidades racializadas e desfavorecidas, e é nosso dever agir decisivamente.

Juntem-se a nós, envolvam-se connosco e ajudem-nos a direccionar o curso da História para um mundo mais justo, inclusivo e resiliente. A vossa participação não é apenas bem-vinda — é essencial.

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