12 anos de agravo: A estranha condenação do militar Deisom Camará

Condenado a 12 anos de prisão pela morte de um colega no regimento de Comandos da Carregueira, inicialmente apontada como suicídio – hipótese que não foi cabalmente descartada pela investigação –, Deisom Camará luta pela liberdade há mais de dois anos. O caso está agora nas mãos do Supremo Tribunal, de quem se espera uma revisão da sentença. Porque a grande certeza que retiramos do processo é que a condenação de Deisom está manchada de dúvidas. Isso mesmo ficou demonstrado numa grande reportagem da jornalista Conceição Queiroz, emitida no início da semana na TVI, e que coloca o caso na lista de temas em análise mais logo, n’ O Lado Negro da Força, hoje com a autora Patrícia Moreira como convidada.

por Paula Cardoso

Imagine alguém ser julgado e condenado por uma morte que a investigação não demonstrou, de forma cabal, como se exige, ter origem criminosa. Pelo contrário, vários documentos oficiais estão pejados de indícios de que a vítima, Luís Teles Lima, se suicidou.

Imagine ainda que o processo criminal e judicial está carregado de incoerências e fragilidades, e que não existe uma única prova digna desse nome que demonstre a culpabilidade do arguido. Pelo contrário, no caso construído contra o militar Deisom Camará abundam elementos que fazem da sua sentença um grave atentado aos mais elementares direitos, liberdades e garantias.

Em prisão preventiva há dois anos, o antigo Comando de 23 anos ouviu o  inimaginável: um veredicto de 12 anos de cadeia pela morte de Luís Lima.

A pena, que contesta no Supremo Tribunal, responsabiliza-o pela morte do ex-colega, ocorrida em 2018 no regimento de Comandos da Carregueira.

Apesar de Deisom Camará ter relatado, desde o primeiro instante, que Luís Lima foi o autor do disparo fatal, pondo fim à própria vida – tese  acolhida no relatório de diligências inicial e não descartada na autópsia –,  a tese de homicídio começou a ganhar terreno.

Plausível?

Para quem nunca ouviu falar no caso com detalhe, algo perfeitamente possível tendo em conta a pouca cobertura mediática que mereceu, a grande reportagem transmitida pela TVI na passada terça-feira, 9, assume contornos fantásticos.

O trabalho, assinado pela jornalista Conceição Queiroz, cumpre exactamente o que promete no título: escancara as dúvidas, muito mais do que razoáveis, sobre a condenação de Deisom Camará.

Desde logo, revela a reportagem, a arma disparada não foi analisada, algo que, conforme reconheceu o ex-inspector da Polícia Judiciária, Paulo Santos, fere as boas práticas de investigação criminal, fragilizando todo o processo.

O especialista, entrevistado por Conceição Queiroz, partilha ainda outra estranheza: não há absolutamente nada no processo que indique o móbil do crime.

Mais: o psicólogo António Correia, também ouvido pela jornalista, assinala a sucessão de elementos que foram ignorados ao longo do processo, e que tinham de ser considerados. O perito que soma 40 anos de experiência com grande ligação à vida militar, é peremptório na apreciação: a tese de homicídio é demasiado frágil.

O somatório de inconsistências e absurdos, onde se destaca também o parecer abonatório de um expert em balística, torna ainda mais incompreensível a sentença.

Até porque, conforme lembrou o psicólogo forense Rui Abrunhosa Gonçalves, na reportagem da TVI: “Mais vale um culpado em liberdade do que um inocente preso”.

A reflexão prossegue mais logo, a partir das 21h30,  n’ O Lado Negro da Força, o talk-show online das noites de quinta-feira, que pode seguir no Facebook e no YouTube. Com José Rui Rosário, Pedro Filipe, Paula Cardoso, Mariama Injai e Danilo Moreira.